5.2.09
O homem que diz adeus no Saldanha...
Lisboa tem provavelmente as melhores personagens do mundo. Já percorri cidades envolventes, mágicas, sonoras, fantasistas, mas às quais fica a faltar o bater quente do coração deste melancólico cotovelo de rio e mar. Um pouco por todo o lado existem figuras que se desenham em cidades, nunca as busquei, mas jamais encontrei em qualquer outra ilusões como as que esta povoam. Nova Iorque tem o guitarrista folk que se passeia em pelota no frio de Times Square, em Madrid coabita Colombo (que não se mexe e permanece sempre no mesmo sítio), Valência conta com Manolo, Washington tinha o Bush. Lisboa colecciona figuras atrás de figuras, num carrossel quase a atirar para a bichanice. São uma espécie de pionéses cravados no mapa da metrópole. Um elo para um mundo (paral)elo...
A minha figura preferida da cidade de Lisboa é o homem que diz adeus no Saldanha... Quem não conhece este artista que lance a primeira pedra? Pronto, se vivem nessas terrinhas deprimentes, género Mogadouro, Vila Nueva del Fresno, Cuba do Alentejo, Sobral de Monte Agraço, se andam por esses lados por favor deixem-se lá ficar quietinhos com os calhaus.
O homem que diz adeus no Saldanha é uma figura histórica do povoado Lisboa. Dá a sensação de que chegou até nós dos tempos das instauração da República. Compara-se às figuras que fazem nomes de ruas naquela zona da cidade, compara-se ao próprio Saldanha, ao Duque da Terceira, aos Defensores de Chaves, Praia da Vitória, à Cinco de Outubro. É, ele próprio, uma figurinha.
Todas as noites, João sai à rua para ser feliz. Acenar a quem passa é sua a única ocupação. Não regateia cumprimentos. Acena para os carros, para os transeuntes, acena para polícias e para os animais vadios. E vai acenando, também para o concièrge do Sheraton e para o hóspede que não imagina o que se está a passar. Vê os carros em circulação, segura quase sempre um saco de plástico de supermercado. Lá dentro sabe-se lá o quê...
Já o encontrei, já me cruzei com João no El Corte Inglés, observei-o de perto, fixei-me naquele semblante a fazer lembrar figura de cinema português da década de sessenta, ou de pintor do pós-guerra, ou de escritor de romances negros. É uma figura anacrónica, mas não destoa, dilui-se na cidade, porque este é também o tempo dela.
Há uns tempos que não vejo o João, talvez tenha ido acenar para outro lado. Talvez já não acene entre nós. Talvez se tenha cansado e encontrado outra forma de ser feliz. Mas, sempre que passo ali ao Saldanha, não resisto a um acenozinho.
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8 comentários:
:) Quando lá passar vou reconhecer-te: o homem do braço no ar ;)
Bruno diz: "Pronto, se vivem nessas terrinhas deprimentes, género Mogadouro, Vila Nueva del Fresno, Cuba do Alentejo, Sobral de Monte Agraço, se andam por esses lados por favor deixem-se lá ficar quietinhos com os calhaus."
O quê????terrinhas deprimentes??? Portugal não é só Porto e Lisboa e acredita que tomara muita gente, mesmo muita, poder ter trabalho próximo dessas "terrinhas" para ter qualidade de vida. Ou achas que andar a passear nos corredores do Corte Inglés é que é qualidade de vida? Ora além de depreciares ao limite os taxistas, mandares uma piadola ou outra à "bichisse" e fazeres analogias entre mulheres e retretes, também catalogas as terras onde muitos nascem, vivem, amam e morrem como deprimentes...se calhar era bom reanalisares as tuas prioridades.
Olha, nem de propósito, a palavra na tua verificação de palavras é "trash" e juro que não estou a inventar!
Olá, Provocação, obrigado pela mesma...
Acredita que a escolha dos nomes das terras não aconteceu ao acaso. São terras que por algum motivo me dizem alguma coisa. Há em portugal terras que são deprimentes, mas não estas decerto. É uma espécie de metonímia, embora não tenha nada a ver...
Tens razão, Portugal não é só Lisboa e Porto, como destinos de férias não são apenas República Dominicana ou Porto Galinhas.
Posso dizer-te que não me passeio pelos corredores do El Corte Inglés. Desse espaço comercial, visito apenas as salas de cinema, e menos vezes o supermercado.
Quanto aos taxistas, se tivesses lido com atenção as minhas palavras, disse que existem taxistas bem porreiros, bem fixólas, mas a maioria merece profundas análises e pancadinhas nas costas.
Quanto às piadas à bichice, mais não faço do que as próprias bichas, que são as primeiras a tecer piadolas sobre si próprios.
Mas obrigado pela tua provocação, Prov..
Quando passar por Mogadouro vou dizer que há, lá nos confins da terra, alguém que os defende.
Prov,
esqueci-me de acrescentar este ponto importante para a compreensão das minhas escolhas:
é que naquelas terras ninguém sabe quem é o homem que acena no Saldanha. Vivem por isso um bocadinho menos felizes. Encontram outros motivos para a felicidade.
Mas acredita que elas não se importam que se escreva que são deprimentes, ninguém nessas terras lê isto, e se porventura alguém tiver a infelicidade de ler não vai levar a sério. Como acontece já com quem por cá passa os olhos.
Olá Bruno,
Bom post! Porém, o âmago é frio, triste, nostalgico... e isto porquê? Porque quando se admira alguém, até pelo mínimo gesto, e ela sai de cena deixa-nos um rasto de saudade que nos acode de lés-a-lés!
Um abraço
Anónimo, miúdo, tens toda a razão. E esta história do homem que diz adeus no Saldanha tem tudo menos a ver com o João. Acontece com aqueles de quem gostamos e que de repente desaparecem das nossas vidas sem percebermos como, nem porquê. Fica o vazio.
Anda a acenar no Alto do Restelo. Passo lá ao fim do dia, a caminho da faculdade e lá está ele, até ao pôr do Sol
Palhaço de merda!!!!
Terrinhas deprimentes é a cona da tua mãe oh palhaço!!!!
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